Texto de autoria de
Pedro Abilleira
Laboratório de Astrobiologia, Universidade de São Paulo, Brasil
Por ser o local onde evoluímos, o planeta Terra possui as condições necessárias para a nossa sobrevivência: temperaturas relativamente amenas e sem enormes flutuações, fontes de alimentos para nossa subsistência, uma atmosfera onde conseguimos respirar, uma camada de ozônio que nos protege dos raios ultravioletas, pressão atmosférica estável para nós… enfim, a lista é enorme. Mas não é por acaso que essas condições são as ideais para nós. Nós e todos os outros organismos presentes na Terra evoluímos neste planeta, onde por milhares, milhões e bilhões de anos fomos nos adaptando às pressões ambientais e evoluindo características que nos permitissem sobreviver a tais condições.
Quando olhamos para nosso vizinho Marte e pensamos em colonizá-lo, logo podemos pensar em vários filmes que trataram do tema da presença humana por lá, como o relativamente recente “Perdido em Marte” de 2015, com o Matt Damon. Mesmo que você não tenha assistido o filme, aposto que consegue imaginar: eles viviam dentro de uma espécie de estrutura fechada (o “hábitat”) que simulava as condições ambientais da Terra e era totalmente isolada da parte de fora. Quando precisavam ir para o lado de fora, colocavam pesados trajes que (vocês adivinharam), levavam dentro de si as condições ambientais de dentro do habitat - que simulam as condições da Terra. Pode ser confuso, não?
Tudo isso serve para nos mostrar que, como a Raquel nos contou no post “O QUE TORNA UM PLANETA HABITÁVEL?”, nós humanos - e as batatas que o Matt Damon cultivou em Marte -, necessitamos de certas condições ambientais para que possamos sobreviver, e que Marte não possui essas condições.
- Mas e agora? Quero que meus netos possam fazer sua viagem de formatura para Marte, mas não quero que eles precisem ficar o tempo todo de traje espacial :’(
Calma! Não sei se seus netos vão conseguir fazer isso, mas muitas pessoas também já desejaram e pensaram muito sobre como tornar a vida humana em Marte menos limitada e mais semelhante ao que estamos acostumados aqui na Terra. Entra no palco o conceito de Terraformação! Criado por Jack Williamson em 1942 para uma história curta de ficção científica (“Collision Orbit”), o termo foi oficializado como o termo mais popular para a ideia em 1979, em um evento oficial da NASA. Mas o que exatamente é esse conceito de terraformação?
O próprio nome do termo já dá um spoiler de seu significado: é a ideia de deliberadamente modificarmos as condições ambientais de um planeta, para torná-lo mais parecido com as condições que temos aqui na Terra - e por consequência, capaz de possuir vida da maneira que estamos acostumados por aqui (considerando que você não é um alien lendo isso de outro planeta - se não for o caso, deixe nos comentários de qual planeta você está lendo isso!). Bom, fazer todas essas mudanças ambientais decididamente não é um processo fácil, barato e nem rápido. Lembre-se, a Terra levou bilhões de anos para chegar até o ponto onde estamos atualmente! Mas independente disso o tema já foi assunto de diversos artigos científicos até pelo próprio astrônomo Carl Sagan, famoso pela sua série Cosmos, da BBC, além de eventos, simpósios e livros de não-ficção.
Uma das propostas mais comuns de começar esse processo de terraformação é a de modificar a pressão atmosférica e temperatura do planeta-alvo. Como um exemplo, a pressão atmosférica de Marte atualmente é de apenas 0,6% da que temos na Terra, e sua temperatura média é de -60ºC. Comumente, sugere-se usar os materiais disponíveis na própria superfície do planeta para que sejam emitidos gases do efeito estufa que, além de adensar essa atmosfera, também elevariam a temperatura do planeta ao ponto de manter estável água líquida na superfície. Contudo, uma estimativa da própria NASA mostra que caso usássemos todos os materiais disponíveis na superfície como fonte de carbono - calotas polares, rochas e solo - mesmo assim a pressão atmosférica subiria de 0,6% para aproximadamente 7% da terrestre. Muito longe ainda do que precisamos. O estudo aventa também outras fontes para a produção desses gases de efeito estufa, como redirecionar cometas contra Marte, mas estima que seriam necessários milhares deles para se observar alguma diferença notável - novamente, não muito prático nem economicamente viável. A estimativa finaliza afirmando que não é possível terraformar Marte com nossas tecnologias atuais, e que tal empreendimento provavelmente só será possível no futuro distante.
É claro que isso não faz as pessoas desistirem de propor ideias e novas tecnologias e técnicas de engenharia em conjunto com biotecnologia, física e muitas outras áreas vão sendo propostas e desenvolvidas num ritmo veloz. Então provavelmente podemos supor que seus netos não irão para um planeta Marte que seja ideal para a vida humana. Mas quem sabe, os seus tatara tatara netos possam fazê-lo!
Bom, a ideia do post de hoje é ser apenas uma introdução muito básica e simples ao tema da Terraformação, então dessa vez ficamos por aqui. Mas esse tópico tem muito pano pra dar de manga, então esperem novas discussões a respeito dele daqui pra frente!
Para saber mais:
SAGAN, Carl. Carl Sagan's cosmic connection: An extraterrestrial perspective. Cambridge University Press, 2000.
PAZAR, Cole C. Terraforming of Terrestrial Earth-sized Planetary Bodies. Planetary and Space Science. En línea: http://doi. org/10.13140/RG, v. 2, n. 20309.12009, 2018.